Luanda – O jornalista e jurista William Afonso Tonet foi excluído da lista de personalidades condecoradas pelo Estado angolano nas celebrações dos 50 anos da Independência Nacional, uma decisão que gerou surpresa e críticas entre diversos setores da sociedade civil.
Mais do que jornalista, Tonet é reconhecido como uma figura histórica da luta pela independência e pela reconciliação nacional. Em 1991, dias antes da assinatura dos Acordos de Bicesse, em Portugal, foi o primeiro mediador não estrangeiro a aproximar as forças militares da UNITA e do Governo, na cidade do Luena, num gesto diplomático que contribuiu para o cessar das hostilidades e abertura ao multipartidarismo.
Desde muito jovem, esteve envolvido na luta armada. Aos 8 anos, já dominava comunicações militares, acompanhando o seu pai Guilherme Tonet, preso pela PIDE em 1968. Aos 16 anos, tornou-se um dos mais jovens comandantes da guerrilha do MPLA. Participou na fundação da OPA (Organização dos Pioneiros de Angola) e das estruturas juvenis da JMPA, tendo sido porta-bandeira na proclamação da independência, a 11 de novembro de 1975.
Trabalhou no gabinete do então ministro da Administração Interna, Nito Alves, como responsável pelas comunicações e assuntos juvenis. Por essa ligação, foi preso durante o episódio do 27 de Maio de 1977, juntamente com o pai e dois tios, que foram enterrados vivos.
Em 1993, durante a guerra dos 55 dias no Huambo, Tonet atuou como correspondente da SIC (Sociedade Independente de Comunicação), sendo o único jornalista estrangeiro presente no cerco. Ferido, percorreu o trajeto entre Huambo e Benguela, após a retirada das forças governamentais e o êxodo da população civil.
Além da sua atuação política e jornalística, Tonet também teve papel relevante na cultura urbana angolana. Através da sua empresa Mundo Vídeo, apoiou a gravação e divulgação dos primeiros trabalhos do grupo de rap SSP (Sociedade Suprema), contribuindo para o surgimento de uma nova geração artística engajada e crítica.
Fundador e diretor do jornal Folha 8, um dos principais veículos independentes do país, William Tonet mantém uma postura firme na defesa da liberdade de imprensa, dos direitos humanos e no combate ao autoritarismo e à corrupção. A sua exclusão das condecorações é vista por muitos como uma tentativa de apagar trajetórias que não se alinham com a narrativa oficial.
A ausência de reconhecimento oficial reacende o debate sobre os critérios utilizados pelo Estado para atribuir homenagens, e sobre o respeito à memória dos que contribuíram para a construção de Angola, dentro e fora das trincheiras.
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