Após um longo duelo com Angola, Ricardo Machado viu a Justiça dos EUA dar-lhe razão e condenar um alto quadro da GE. Agora, quer virar a página e investir em projetos em Portugal e outros países.
Ricardo Leitão Machado, que em tempos liderou a Aenergy, uma das maiores empresas de energia em África, passa hoje a maior parte do tempo em países como Espanha e Reino Unido. Em 2019, o Estado angolano arrestou os ativos da Aenergy no país, acusando-a de fraude num negócio de turbinas de mil milhões de euros. Deste então, o empresário português não desistiu de procurar provar a sua inocência, levando o caso a vários tribunais internacionais. Até que, em março, a Justiça norte-americana deu como provado que um antigo executivo da General Eletric falsificou documentos para incriminar a Anergy e afastá-la do negócio, aproveitando a ofensiva do presidente João Lourenço contra vários grupos económicos que haviam prosperado durante o longo mandato do seu antecessor, José Eduardo dos Santos.
De acordo com o Jornal de Negócios, um tribunal de Nova Iorque concluiu que o representante da General Eletric em Angola, Wilson da Costa, cometeu os crimes de falsificação de documentos e usurpação de identidade, com o objetivo de incriminar a Aenergy. Além de sete anos de prisão efetiva, Wilson da Costa foi condenado a três anos de pena suspensa e ao pagamento de uma multa de 100 mil dólares. Foram-lhe ainda apreendidos cinco milhões de dólares.
Porém, não foi ainda o fim da batalha judicial. Neste momento, aguarda-se a decisão de um tribunal arbitral de Washington, num processo colocado pela Aenergy contra o Estado angolano. Por outro lado, a investigação aberta pelas autoridades angolanas em 2019 não teve desenvolvimentos, nem a contestação ao arresto.
Numa conversa com o DN, a que pode assistir em vídeo nesta página, Ricardo Leitão Machado mostrou-se aliviado com a decisão da Justiça norte-americana, realçando o facto de visar altos quadros de um grande grupo dos EUA. “O juiz provou e comprovou, inclusive o Departamento de Justiça investigou bastante. E nós fizemos parte, apoiámos essa investigação. E o juiz decidiu, após um processo que demorou mais de um ano a ser investigado – que tinha sido o CEO da África da General Eletric”, disse.
“A Aenergy, que em tempos foi um grande playerem África e tinha a energia mais barata do continente, é agora uma entidade que apenas tem existência jurídica e vive para estes processos judiciais. Mas nunca desistimos de tentar provar a nossa inocência. Creio que o que aconteceu foi que alguém achou que simplesmente nos conseguiria afastar do negócio e que não teríamos força para resistir estes anos todos”, afirmou.
A decisão da Justiça norte-americana segue-se a um acordo, assinado em 2023, mediante o qual a General Eletric – que substituiu a Anergy nos contratos com o Estado angolano – terá pago uma compensação à empresa de Ricardo Machado para que esta retirasse os processos que lhe moveu. O empresário não quis comentar este acordo, por dever de confidencialidade, mas na altura foi noticiado que a General Eletric terá pago cerca de 300 milhões de dólares à Aenergy.
Atualmente, Ricardo Leitão Machado tem negócios em vários sectores, incluindo as Termas de Monfortinho (onde vai lançar, esta terça-feira, uma água mineral com uma embalagem de metal, para se diferenciar das marcas que ainda usam plástico). Em 2022, comprou a Herdade do Vale Feitoso, que ocupa 7.500 hectares e pertenceu em tempos ao GES. O empresário quer investir no “capital natural”. disse. “Isto é como quem planta sobreiros. Investimos a pensar nas próximas gerações”, defendeu. Para o futuro, pretende “investir em força nos sectores das águas e também na aviação”, explicou, acrescentando que neste último sector a aposta será nos helicópteros, devido ao seu potencial no combate aos fogos florestais e no turismo, sobretudo no sul da Europa.
“Sempre trabalhei com os maiores bancos espanhóis, mas em Portugal o compliance nem sempre funciona bem”
Questionado sobre se os seus problemas em Angola dificultaram o seu percurso empresarial nos últimos anos, nomeadamente em termos de financiamento bancário, o empresário respondeu que o compliance dos bancos portugueses nem sempre consegue ter acesso a toda a informação e que há um “caráter discricionário” em muitas decisões, mas que as suas empresas, que empregam cerca de 200 pessoas, nunca tiveram dificuldades em financiar-se.
“Em Espanha, o meu banco sempre foi o Santander. Sempre me apoiaram e quando surgia alguma questão eu explicava e pronto. Por isso os nossos projetos continuaram a avançar. Mas em Portugal os bancos nem sempre têm essa capacidade, o que é pena, porque é preciso apoiar as empresas e os empresários portugueses”, disse Ricardo Leitão Machado, que foi e é acionista de bancos em África.
DN