Além de transgressões graves como não comunicar incidentes de ciberataques às autoridades, as empresas podem ser simultaneamente punidas com coimas e com sanções acessórias, como a perda dos equipamentos ou encerramento do estabelecimento. Especialista considera que a lei é equilibrada e protege os direitos fundamentais.
As infracções à legislação sobre Inteligência Artificial (IA) podem resultar em penas de prisão até 12 anos para quem proceder à implantação ou usar de forma dolosa os sistemas de IA, bem como em multas que podem atingir 750 milhões Kz para pessoas singulares e 1,5 mil milhões Kz para empresas. As sanções constam na proposta de Lei sobre a IA, colocada em consulta pública desde Setembro deste ano pelo Ministério das Telecomunicações, Tecnologias de Informação e Comunicação Social (MINTTICS).
No documento, constituem crimes puníveis com penas de prisão de um a 12 anos as acções que violem a privacidade e os direitos fundamentais salvaguardados pela proposta, que promovam discriminação ou incitem ao ódio através de algoritmos, bem como aquelas que causem danos graves à segurança nacional, à ordem pública ou ao processo democrático. O artigo 76.º da proposta criminaliza ainda a facilitação de crimes contra o Estado, incluindo espionagem, terrorismo ou outros actos que atentem contra a segurança nacional, além dos que comprometam de forma irreparável a integridade das instituições.
A recolha de informações pessoais sem consentimento ou o uso indevido de IA para avaliações privadas é considerada uma transgressão administrativa grave, passível de multa de até 1,5 mil milhões Kz no caso das empresas e 750 milhões Kz para pessoas singulares.
Na prática, supermercados, bancos e outros estabelecimentos comerciais passam a ser obrigados a explicar as razões da recolha de dados dos clientes e a finalidade do seu uso. O cliente, por sua vez, ganha o direito de recusar que os seus dados sejam utilizados para treinar sistemas de IA ou exigir que sejam anonimizados, garantindo a protecção da sua privacidade.
O incumprimento destas disposições pode resultar em contra-ordenações e coimas, conforme previsto na proposta. Esta medida reforça o princípio da transparência e explicabilidade, considerados pilares fundamentais da regulamentação da indústria de IA. Tais princípios impõem aos operadores o dever de fornecer informações claras sobre produtos e serviços baseados em IA, explicando, de forma adequada, o seu funcionamento, propósito e intenção.
Há outras transgressões que são consideradas graves como a falta de registo de IA crítica (aplicadas em áreas como saúde, educação) dentro do prazo legal, ou a não comunicação de incidentes de ciberataques “significativos” às autoridades (ver página 4).
Além das contra-ordenações graves, as empresas podem ser simultaneamente punidas com coima e com sanções acessórias, como a perda dos equipamentos ou sistemas utilizados na prática da contra-ordenação, encerramento do estabelecimento por período de dois anos, assim como privação do direito a subsídio ou beneficio outorgado por entidade ou serviço público por período de dois anos e também suspensão de registos, licenças ou quaisquer autorizações dadas nos termos da presente lei e demais legislação complementar, por período de dois anos, conforme o artigo 73.º da proposta.
Para Sérgio Lopes, CEO da New Cognito, empresa tecnológica do Grupo Mitrelli, ouvido pelo Expansão, a proposta de lei é, em teoria, “robusta” e consegue articular de forma equilibrada a protecção dos direitos fundamentais dos cidadãos com a promoção da inovação tecnológica e digital. “O grande desafio reside na capacidade de fiscalização técnica (normas, laboratórios e peritos) e na coordenação entre reguladores, nomeadamente a futura Autoridade de IA, a APD e o INACOM. Sem esta engrenagem, corre-se o risco de perder proporcionalidade na prática”, afirmou o especialista.
No entanto, Sérgio Lopes admite que a proposta representa um esforço para garantir que o avanço da Inteligência Artificial ocorra sem atropelar os princípios democráticos. Contudo, sublinha que a eficácia desta arquitectura normativa só será comprovada quando entrar em fase de execução, um teste decisivo para validar intenções e mecanismos.
Soberania tecnológica
Num contexto marcado pelo avanço de tecnologias emergentes como a IA, onde o principal motor são os dados, um novo poder vem ganhando força no mundo: a soberania tecnológica das nações.
Expansão
