Em junho de 2025, um episódio envolvendo a companhia aérea TAAG – Linhas Aéreas de Angola e o activista Hitler Samussuku, actualmente doutorando no Brasil, abriu caminho para uma disputa judicial que hoje começa a ser analisada pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal. O caso ilustra não apenas a relação entre consumidor e empresa, mas também levanta reflexões sobre responsabilidade institucional e a imagem de companhias estatais em contextos internacionais.
Hitler Samussuku tinha viagem marcada para Luanda, onde participaria do lançamento do livro Angola Pós-Dos Santos, obra da qual é co-autor, além de compromissos académicos e diplomáticos, incluindo um encontro com o embaixador da Noruega e uma conferência na Universidade Católica de Angola. A importância da deslocação era, portanto, evidente.
O voo, entretanto, foi interrompido após uma falha técnica identificada quando a aeronave já se encontrava no ar. Todos os passageiros foram evacuados e realocados em voos subsequentes, excepto o Hitler Samussuku. O activista afirma ter buscado diálogo directo com a empresa, alertando para a relevância dos compromissos que perderia, mas não obteve resposta. A Embaixada da Noruega também teria tentado interceder, sem sucesso.
Diante do impasse, Hitler Samussuku decidiu accionar judicialmente a TAAG no Brasil, exigindo uma indenização de 57 mil reais por danos morais. O processo ganhou contornos simbólicos: trata-se de um cidadão angolano que, no exterior, recorre a tribunais estrangeiros para responsabilizar a transportadora aérea nacional, frequentemente criticada por deficiências na gestão e no atendimento.
A audiência marcada para esta noite, às 20h00 em Angola, representa a primeira vez em que o activista será ouvido formalmente pelo tribunal. Independentemente da decisão judicial, o caso coloca em evidência três pontos centrais: o nível de preparação técnica e organizacional da TAAG para lidar com crises; a dificuldade de comunicação entre empresas públicas angolanas e os seus utentes; e o impacto que episódios como este têm sobre a reputação internacional de uma companhia aérea que simboliza, para muitos, a porta de entrada do país.
Mais do que uma disputa pessoal, a acção levanta um debate mais amplo sobre direitos do consumidor, a qualidade dos serviços públicos em Angola e o papel das instituições estatais em um mundo cada vez mais interconectado. Ao mesmo tempo, revela como falhas operacionais podem rapidamente ganhar dimensão política e simbólica quando envolvem figuras públicas, activistas ou intelectuais em trânsito internacional.
Seja qual for o desfecho, o processo judicial contra a TAAG funciona como um espelho: reflete as fragilidades de uma empresa que representa o Estado e a exigência, cada vez mais presente, de que cidadãos angolanos — dentro ou fora do país — sejam tratados com o devido respeito e responsabilidade.
Francisco Lima