Empresário chinês que falsificou certidão comercial suspeito de montar “esquema de extorsão” e de “manipular” o Tribunal da Comarca do Soyo

O empresário chinês, naturalizado português, Zhan Yongqiao – arguido no caso da falsificação da escritura pública da empresa I.M.I Ilundo (SU), Lda., junto do Cartório Notarial do Kilamba Kiaxi —, é suspeito de ter montado um alegado esquema de extorsão, que tem como ‘palco’ o Tribunal da Comarca do Soyo, onde decorre o julgamento de um processo-crime, do qual é réu o empresário Yongfeng Gao ‘Cowboy’, titular da empresa que teve a certidão comercial falsificada pelo agora ofendido.

Em causa está um processo-crime através do qual o empresário Zhan

Yongqiao acusa o empresário chinês Yongfeng Gao ‘Cowboy’ de o ter burlado aquando do início de uma parceria comercial que os ligou entre os meses de Julho e Novembro de 2020, quando, por incumprimento do acordado, o empresário Zhan Yongqiao decidiu falsificar a certidão comercial da empresa promotora do ‘Projecto

Porto Canal Yapoto’, localizado no município do Soyo, sem o consentimento do único titular da empresa.

Origem do caso

Em 2020, Zhan Yongqiao e Yongfeng Cao firmaram uma parceria comercial que visava a construção de um porto comercial (de transporte e cargas), duas pontes-cais, uma unidade de processamento de pescado e uma doca, no Canal Yapoto, no município do Soyo.

Para a materialização do referido empreendimento, o empresário Zhan Yongqiao comprometeu-se a desembolsar um investimento na ordem dos 10 000 000,00 USD (dez milhões de dólares norte-americanos), ao passo que o seu então parceiro, o mentor do projecto, Cowboy, avançaria com sete milhões de dólares norte-americanos.

O projecto, porém, acabou frustrado

quando, a 15 de Janeiro de 2021, Zhan Yongqiao

tenta, através da Loja dos Registos de Mbanza Kongo, alterar, por meios fraudulentos e sem o consentimento do titular da empresa, o pacto social da I.M.I Ilundo (SU), Lda., a empresa afecta ao empresário Cowboy.

Ao confrontar-se, primeiro com a tentativa de falsificação do pacto social da sua empresa, em Mbanza Kongo — e depois com a certeza da adulteração fraudulenta da mesma em Luanda, junto do Cartório Notarial do Kilamba Kiaxi — 0 empresário Yongfeng Gao recorreu ao Serviço de Investigação Criminal

(SIC) do Soyo, onde fez uma participação criminal contra o empresário Zhan Yongqiao, que até hoje não obteve qualquer resposta das autoridades.

Por ironia do destino e contra todas as expectativas, Zhan Yongqiao, usando do mesmo expediente, isto é, recorrendo ao SIC-Soyo, conseguiu que fossem colocadas em marcha três acções, duas das quais criminais e uma civil, em que o ‘lesado’ é transformado em arguido e o ‘autor’ da falsificação da certidão comercial da empresa I.M.I Ilundo (SU), Lda., passou a ser o ofendido.

O julgamento

O processo agora em julgamento no Tribunal da Comarca do Soyo alimenta as suspeitas e a convicção da defesa de se tratar do reeditar do modus operandi usado no primeiro processo-crime, já transitado em julgado, no qual o empresário Zhan Yongqiao acusava de infidelidade o antigo ‘sócio’ Yongfeng Gao, que acabou condenado a pagar uma indemnização de 141 milhões de kwanzas, com base numa factura ‘duvidosa’, porém, aceite em tribunal como ‘válida’.

À semelhança do primeiro processo, que resultou do rompimento da parceria comercial entre as empresas I.M.I Ilundo (SU), Lda., do arguido Yongfeng Gao, e a Tian Yi He-Pescas, Lda., do queixoso, o processo-crime em julgamento apresenta uma particularidade: aquando da participação criminal feita junto do SIC-Soyo, o empresário Zhan Yongqiao queixou-se de ter feito uma transferência bancária, da sua conta empresa para a conta empresa de Yongfeng Gao, na ordem dos 400 milhões de kwanzas.

Os números que não batem certo

No entanto, à medida que o julgamento vai se desenrolando e caminhando para o seu desfecho, Zhan Yongqiao tem dificuldades em fazer prova da acusação formulada pelo Ministério Público, já que os números por ele apresentados não combinam com as provas constantes nos autos.

Na audiência de 15 de Maio de 2025, por exemplo, o empresário Zhan Yongqiao, ao ser questionado pela defesa de Yongfeng Gao se havia procedido à transferência dos 400 milhões de kwanzas que consta na acusação do Ministério Público — imputação esta baseada na participação criminal que o próprio apresentou ao SIC-Soyo — respondeu que “desconhecia tal alegação, já que tinha as provas todas do valor investido nos autos”.

No entanto, em sede do mesmo interrogatório e na mesma audiência, o valor que inicialmente dizia ter investido e que deu origem à queixa-crime por alegada burla deixou de ser os 400 milhões de kwanzas e passaram para “mais de 400 milhões de kwanzas”, para daí ser transformado em “500 milhões de kwanzas” e no instante a seguir para “mais de 500 milhões de kwanzas”, sem, porém, fazer qualquer prova documental do referido valor.

Para baralhar ainda mais as contas, o advogado do queixoso corrigiu o valor que o seu constituinte dizia ter investido na parceria comercial e aponta para um investimento na ordem dos 614 milhões kz e não mais os 400 milhões de kz que o Ministério Público fez constar na acusação ou os “500 milhões kz” a que o empresário fez alusão em tribunal.

Entretanto, nos autos constam trocas de correspondências, e, em uma das quais, o queixoso Zhan Yongqiao admite ter investido na parceria, entre Julho de 2020 e Setembro de 2020, o valor de 261 000 000,00 (tel:261%C2%A0000%C2%A0000,00) kz (duzentos e sessenta e um milhões de kwanzas), repartidos entre valores monetários (161 000 000,00kz) e equipamentos e materiais (100 000 000,00kz).

Metamorfose de valores

No entanto, na audiência de 22 de Maio de 2025, já na fase das alegações finais, período que se segue à produção de provas, deu-se um novo facto: o advogado do queixoso requereu a junção de novos documentos, que são,  na verdade, facturas que “fariam” prova do investimento realizado pelo seu constituinte, que, afinal, já não eram os 614 milhões kwanzas ditos no dia 15 de Maio de 2025, mas, sim, 737 809 608,33 (tel:737%C2%A0809%C2%A0608,33) kz(setecentos e trinta e sete milhões, oitocentos e nove mil e seiscentos e oito kwanzas e trinta e três cêntimos).

A defesa do arguido Yongfeng Gao, que vê semelhanças com o modus operandi utilizado no primeiro processo em que queixoso saiu vencedor, usando uma factura ‘duvidosa’, opôs-se à junção das referidas facturas, alegando ter sido ultrapassado a fase de produção das provas. Porém, sem qualquer efeito, uma vez que o juiz da causa, João Bengui, decidiu admitir as ‘novas provas’.

Facturas emitidas pelas empresas do queixoso

Mas, sobre facturas não é tudo. Nos autos, o queixoso fez constar algumas delas, e, segundo afirma, fazem fé do aluguer de máquinas usadas na fase inicial de implementação do ‘Projecto Porto Canal Yapoto’. Essas facturas, no entanto, não estão certificadas pela Administração Geral Tributária (AGT) e foram emitidas por algumas empresas pertencentes ao próprio queixoso.

É o caso das empresas HF-Uniauto, Lda e da Huafeng – Construção e Engenharia, Limitada. Todas elas têm como tronco comum o empresário Zhan Yongqiao como gerente, o que alimenta a ideia da defesa de se tratar de um esquema de extorsão com recurso a um expediente semelhante àquele usado no primeiro processo, que resultou numa indemnização de 141 milhões de kwanzas.

E mais: as facturas que constam nos autos não estão em nome da Tian Yi He-Pescas, Lda., nem tão-pouco da I.M.I Ilundo (SU), Lda, as duas firmas ligadas pela parceria comercial que foi rompida. Antes pelo contrário, algumas facturas foram emitidas pela HF-Uniauto, Lda a favor da Huafeng – Construção e Engenharia, Limitada.

A próxima audiência de julgamento está marcada para o dia 12 de Junho, durante a qual devem ser conhecidos os quesitos e a leitura da sentença do caso em que um lesado se viu transfigurado em arguido e o suspeito transformado em ofendido.

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