Angola entre os 10 países africanos onde é muito mais caro fazer crédito

POLÍTICA MONETÁRIA. Economistas defendem a criação de uma taxa de juro bonificada voltada para produção, que seja mais inclusiva entre os diversos sectores.

Banco Central manteve a taxa de juro de referência (a Taxa BNA) nos 19,5%, na reunião do Comité de Política Monetária (CPM), realizadano último dia 18 deste mês, retendo Angola no grupo dos 10 países com as taxas de juro mais elevadas, mais concretamente na oitava posição.

Há mais de um ano que o Banco Central mantém inalterada a taxa de referência, situação que vem sendo justificada com a conjuntura económica marcada por factores que tendem a pressionar os preços, apesar dos sinais de abrandamento em termos homólogos, contrariados, entretanto, pela ligeira aceleração de 0,04 pontos percentuais na variação mensal em Junho.

Em relação à comparação no contexto africano, entre os 10 países com a taxa de dois dígitos, consideradas das mais altas do continente, figuram o Zimbabué com 35%, Gana (28%), Nigéria (27,5%), Malawi (26%) e República Democrática do Congo (25%), colocados nos cinco primeiros lugares. Esta lista dos países com a taxa acimados 20% é fechada pelo Egipto (24%) e Serra Leoa (23,75%). Mais abaixo, Angola (com 19,5%), Libéria (17%) e Gâmbia (17%) fecham o top 10. No conjunto destes países, Angola e o Egipto são os únicos que decidiram manter inalteradas as taxas de referência em Julho.

Em outro extremo, os Países com a taxa de juros mais baixas, até ao fecho desta edição, são Seicheles com 1,75%, Botsuana 1,9%, Marrocos 2,25%, e Cabo Verde 2,5%.

OS DOIS LADOS DA MESMA MOEDA

Dois economistas afectos ao Centro de Investigação Económica da Universidade Lusíada (Cinvestec) e do Centro de Estudos e Investigação Científica (CEIC) da Universidade Católica entendem que a decisão do banco central de manter a taxa de juro é quase ‘acertada, na perspectiva de ter considerado que é alta o suficiente para inibir o crédito e, consequentemente, poder diminuir a massa monetária em circulação para garantir a estabilidade depreços. Entretanto, admitem, no outro sentido, que prejudica o crescimento económico pelo facto de tornar o crédito mais caro.

O investigador económico do CEIC Francisco Paulo explica que o “crédito com taxa de juros muito alta chega a ser prejudicial a economia”. É, por isso, exemplifica, que “nos Estados Unidos o Banco Central tem dois objectivos, não apenas garantir a qualidade do preço, mas também garantir o crescimento económico, ou seja, o emprego”.

O economista admite que são dois objectivos contraditórios, mas refere que o BNA tem de ter atenção, pois, “quanto mais alta for a taxa de juro, mais prejudicial é para os negócios e para a criação de emprego”.

“O mandato do BNA é só garantir a estabilidade da moeda. Não tem o mandato de garantir a promoção do crescimento económico. Épor isso que fazo que faz. O BNA, infelizmente, só está focalizado na estabilidade da moeda para reduzir a inflação”, nota Francisco Paulo, ao mesmo tempo que observa que a inflação “não é apenas um fenómeno monetário”, justificando que a “luta para a estabilização do preço não depende apenas do BNA, porque há factores que estão fora do seu controlo”.

O director do Cinvestec, Heitor Carvalho, por sua vez, entende que o problema não está na taxa BNA, já que esta retira liquidezdo mrcado, nomeadamente liquidez bancária suficiente para que não haja tanta inflação. Para ele, o problema está no facto de não existir uma taxa de juro voltada para produção, caracterizando os Avisos 9 e 10 do BNA como “muito limitativos”.

“O problema é que esses avisos são demasiados limitativos. E aí que se corrige a taxa de juro para a produção, é nos avisos 9 e 10. Primeiro, eliminar aqueles 56 produtos e dizer “nós apoiamos tudo o que é produção, seja ela produção de uma canção de um novo grupo musical, quer seja produção de conhecimento numa universidade, quer seja produção de mandioca, quer seja a produção de construção, quer seja a produção de, por exemplo, rádios ou jornais privados. E deve ter apoio sob a forma de ter uma espécie de uma taxa BNA para a produção””, defende Heitor Carvalho.

Heitor Carvalho explica que, sustentado pelo OGE, na prática o BNA empresta dinheiro aos bancos a uma taxa muito menor, ou seja, passa a ter uma taxa de cedência de liquidez especial para a produção. “Tem de ser o Estado a suportar o ónus da política de crédito. Não pode ser o banqueiro. Se mete o banqueiro a suportar o ónus da política de crédito, o banqueiro, por isso mesmo, não vai fazer. Vai dizer que o projecto está mal feito, vai dizer que tem muitas dúvidas que aquele projecto possa gerar resultados, nunca mais vamos ter cré-dito. A bonificação dos juros tem que ser pelo BNA, que pode perfeitamente fazê-la concedendo crédito mais barato a quem empresta aos bancos para a produção, e pelo Estado, pelo OGE, bonificando o crédito à produção. Quer dizer, sendo o próprio OGE a pagar ao banqueiro parte dos juros que o banqueiro exige para emprestar.”

Ainda assim, Francisco Paulo considera que existem empresários dispostos a arriscar a taxa alta, contudo, por questões de amiguismo “os critérios de atribuição de crédito são muito obscuros”.

Valor Económico

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