O analista independente e estrategista financeiro, Joelson Sissunda, criticou a recente entrada da petrolífera britânica Shell no mercado angolano, alertando para o que considera serem riscos de soberania e vulnerabilidade económica associados às parcerias estabelecidas pelo Governo com companhias estrangeiras.
Para o especialista, o regresso da multinacional, após duas décadas de ausência, com negociações para integrar o Bloco 33 em parceria com a Sonangol e a Chevron, é “um sinal claro da fragilidade do Estado”, que continua a depender de investidores externos para viabilizar os seus projetos estratégicos.
“A Shell já demonstrou em mercados como Nigéria, África do Sul, Gabão, Quénia e Egito que tende a entrar apenas para controlar ativos logísticos e margens comerciais. Hoje, está fora das refinarias desses países, mas viu em Angola uma oportunidade perfeita para retomar posição, aproveitando a pressa do Governo em arrecadar receitas fiscais”, afirmou Sissunda.
O analista lembra que a refinaria de Cabinda, detida em 90% pela Gemcorp e apenas 10% pela Sonangol, bem como a possibilidade de a Shell vir a integrar a refinaria do Lobito, são exemplos de como ativos-chave continuam a ser entregues a entidades estrangeiras, deixando Angola com participações minoritárias.
Para Sissunda, a estratégia do Executivo, que combina simultaneamente negociações sobre refinarias, Eurobonds e corredores logísticos, aumenta os riscos do país.
“Qualquer choque externo, como uma queda do barril de petróleo para 60 dólares ou uma desvalorização do kwanza para 1.200 Kz, pode obrigar o Estado a ceder ativos como garantia. Foi este o erro que levou Moçambique à crise dos empréstimos ocultos e o Sri Lanka a entregar o porto de Hambantota à China”, exemplificou.
O analista também sublinha as diferenças com a vizinha Namíbia, que mantém uma dívida de apenas 110 milhões de dólares junto à China, enquanto Angola deve cerca de 8,9 mil milhões de dólares.
“Este contraste mostra que estamos a perder margem de manobra estratégica ao executar vários projetos em simultâneo sem a devida coordenação”, criticou.
Joelson Sissunda alerta ainda que a aposta do Presidente João Lourenço em sucessivos contratos com petrolíferas ocidentais é também uma forma de garantir apoio político internacional para o seu mandato.
“Faltam menos de 25 meses para o fim da legislatura, e o chefe dos camaradas tem usado as contratações simplificadas como carta branca para reforçar proteções externas”, concluiu.
De salientar que a multinacional britânica Shell oficializou o seu regresso a Angola, após um interregno de aproximadamente 20 anos, ao assinar um memorando de entendimento com a Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANPG), em parceria com a Chevron e a Sonangol. O acordo visa estudos conjuntos para a exploração no Bloco 33, localizado na Bacia do Congo.
O anúncio foi feito durante um dos painéis da Conferência Angola Oil & Gas 2025 (AOG25), onde o Ministro dos Recursos Minerais, Petróleo e Gás, Diamantino Azevedo, afirmou que “onde há tranquilidade e bom clima de negócios, o investimento vem.”
A frase sintetiza o novo ambiente institucional angolano, marcado por reformas estruturais, maior previsibilidade jurídica e estímulos à competitividade.
Segundo o vice-presidente executivo da Shell, Eugene Okpere, Angola permanece um destino estratégico para investimentos petrolíferos, graças à melhoria do ambiente de negócios e aos incentivos fiscais promovidos pelo Executivo.
O acordo insere-se na estratégia de oferta permanente da ANPG, que permite negociações directas para os blocos não adjudicados em rondas anteriores.
Imparcial Press