Baía Farta — Pelo menos 30 novas salinas operadas por empresários chineses, vietnamitas e da Eritreia estão a produzir sal marinho em tanques plásticos instalados em terrenos onde antes funcionavam cemitérios, na região da Baía Farta, província de Benguela. O produto já está a ser comercializado à população local, levantando sérias preocupações sanitárias e ambientais.
Segundo denúncias de residentes e técnicos locais recolhidas pelo Club-K, os empreendimentos usam geomembranas plásticas para acelerar a evaporação da água do mar e extrair o sal. No entanto, estudos científicos internacionais alertam que a degradação dessas membranas pode contaminar o sal com microplásticos, partículas invisíveis que têm impactos nocivos à saúde humana.
Para evitar acções de fiscalização, os empresários estrangeiros têm adotado uma estratégia de marketing institucional: distribuem sal gratuitamente às administrações municipais, sob pretexto de solidariedade com famílias vulneráveis no âmbito do combate à cólera. A prática tem funcionado como escudo político e dificultado uma intervenção efectiva das autoridades de fiscalização sanitária e ambiental.
Risco de contaminação por microplásticos
De acordo com um estudo publicado na Rasayan Journal of Chemistry, geomembranas plásticas, como as usadas nessas salinas, degradam-se quando expostas ao calor, à radiação solar e à salinidade, liberando partículas de plástico no sal durante o processo de evaporação da água. Outro estudo, divulgado na revista Scientific Reports, identificou microplásticos em todas as amostras de sal de mesa analisadas em Taiwan, destacando polipropileno, polietileno e poliestireno como os polímeros mais comuns.
A ingestão crónica de microplásticos está associada a inflamações, disfunções imunológicas, estresse oxidativo e exposição a substâncias tóxicas, como metais pesados e poluentes orgânicos persistentes, segundo a BioMed Central.
Uso de terrenos sensíveis
Além da contaminação por microplásticos, o Club-K apurou que muitas dessas salinas estão a ser erguidas sobre antigos cemitérios, situação que revolta parte da comunidade local e levanta dúvidas sobre a legalidade e o respeito por normas sanitárias e culturais. “É uma agressão simbólica e ambiental. Estamos a comer sal produzido onde foram enterradas pessoas”, declarou um morador sob anonimato.
Especialistas pedem acção do Estado
Ambientalistas e engenheiros sanitários consultados pelo Club-K defendem que o Estado angolano precisa agir com urgência para:
• Fiscalizar e monitorar a qualidade do sal vendido no mercado;
• Banir o uso de plásticos degradáveis nos tanques de produção;
• Proibir actividades comerciais em áreas sensíveis como antigos cemitérios;
• Estabelecer padrões mínimos para a produção segura de sal marinho.
Recomendações técnicas
Entre as soluções sugeridas por especialistas estão o uso de materiais alternativos como aço inoxidável ou concreto nos tanques, manutenção regular das infraestruturas existentes e a implementação de testes laboratoriais frequentes para detecção de microplásticos no sal.
Enquanto o país enfrenta surtos de cólera e outras doenças relacionadas à falta de saneamento, a possível presença de microplásticos em produtos alimentares como o sal marinho representa uma ameaça silenciosa, mas urgente à saúde pública.
Club-k.net